Desde o aparecimento da Dino 206 GT, em 1968, não se via uma nova dinastia na Ferrari. Apresentada no Salão de Paris, em outubro, a California traz para Maranello a era do câmbio de embreagem dupla e sete marchas e a do teto rígido escamoteável, recurso que faz com que assuma personalidade bipolar, alternando ares de cupê e conversível. Quer mais? Então tome motor central-dianteiro, disposição que não se via na marca há 35 anos, desde o modelo 308. Trata-se de um oito-cilindros com injeção direta, de olho em menores consumo e emissões, preocupações universais.
Nos meses que antecederam o lançamento, muito foi dito sobre a California. Anunciou-se que ela seria uma mini-Ferrari, um carro mais barato. “Essa idéia nunca existiu”, disse Luca di Montezemolo, presidente da Fiat, controladora da Ferrari. “Desde o início, nosso plano era fazer um Gran Turismo inédito que permitisse conquistar novos consumidores, mas com performance e conforto dignos de nossa tradição.”
Para chegar à California, atravessamos a Itália e fomos a Mazara del Vallo, na extremidade oeste da Sicília, a ilha onde o modelo foi apresentado sob o sol que nesta época abandona Maranello, no centro da Itália, e deixa uma bruma cinzenta, típica dos meses mais frios, tomando conta dos arredores.
A nova Ferrari foi inspirada em um clássico italiano dos anos 1950. Em 1957, a 250 California foi desenvolvida a pedido dos dois distribuidores da marca nos Estados Unidos, o italiano Luigi Chinetti e o norte-americano John von Neumann. A dupla pretendia turbinar as vendas da marca com um modelo charmoso e possante, ideal para rodar pelas estradas ensolaradas da costa oeste americana. Enzo Ferrari ouviu os argumentos e topou produzir o conversível. Foi um sucesso que marcou época. Do clássico desenhado por Battista Pinin Farina, a recém-chegada herdou traços como as entradas de ar no capô e nos pára-lamas e a linha lateral. É um projeto completamente novo, com chassi e carroceria de alumínio.
“Há quatro anos, quando começamos a conceber o carro, não pensamos em um modelo com estilo retrô, mas em um carro bonito e veloz, mas não necessariamente extremo, como os feitos para quem gosta de eventos de pista”, diz Roberto Corradi, diretor de desenvolvimento do California. O resultado é um carro elegante, com 4,56 metros de comprimento, chassi e carroceria de alumínio, capô alongado, elegantes faróis com diodos e lanternas bem redondas que se projetam sobre os flancos traseiros.
Opções no cardápio Bonita por fora, por dentro a nova Ferrari não desaponta ao reunir o melhor do mundo dos carros luxuosos. No painel de instrumentos destaca-se o grande conta-giros (ladeado pelo velocímetro) analógico, com um indicador de marchas. À esquerda, um dispositivo digital mostra as funções de relógio, termômetro e também pode mostrar temperatura do motor e do radiador e pressão dos pneus. Os bancos dianteiros, esportivos e revestidos de couro e com regulagem elétrica, acomodam bem os ocupantes, que contam com ar-condicionado dual zone. O mesmo elogio não se estende ao espaço disponível atrás, apesar de os engenheiros da marca italiana e o próprio Montezemolo definirem a California como um 2+2. Mas, se falta espaço para as pernas de adultos na parte traseira, há razoáveis 240 litros no porta-malas, mesmo com a capota abaixada (com ela recolhida, essa capacidade ganha mais 100 litros). Há a vantagem de aproveitar o espaço na parte de trás para carregar objetos maiores, já que ela se comunica com o porta-malas.
Giro a chave na ignição e aperto o botão para dar a partida, o “Engine Start”, não por acaso pintado de vermelho, situado à esquerda no volante. Antes de seguir na direção de Trapani, a oeste, sobre asfalto úmido, calibro o manettino – o seletor, do lado direito da direção, que regula a suspensão e a tração do carro – para a posição confortável (no cardápio há ainda a opção esportiva e a que libera o controle de estabilidade). Depois de acelerar o V8 apenas para ouvir sua “música”, o vento frio me convence a fechar a capota e decido iniciar o percurso posicionando o manettino na opção esportiva. Que a diversão comece.
Com os mesmos 4,3 litros do motor que equipa a F430, a California tem 460 cv, 30 a menos. “São duas arquiteturas bem diferentes, em que privilegiamos o conforto no novo modelo”, afirma o italiano Vittorio Dini, engenheiro da Ferrari que coordenou seu desenvolvimento. Segundo ele, o bloco é o mesmo, mas os diâmetros dos cilindros são distintos: 94 milímetros na California, 92 milímetros na F430. “Com isso, privilegiamos o torque em baixa rotação”, diz Dini. Outra mudança é que com a injeção direta a taxa de compressão passou para 12,2:1, ante 11,3:1 na F430, o que ajudou a reduzir consumo e emissões de CO2. “A California consome cerca de 15% a menos que a F430 e é um belo passo na direção de carros mais econômicos e menos poluentes”, afirma Dini.
Com discos de cerâmica e F1-Trac, o controle de tração que equipa a California (e que entra em ação caso uma das rodas não tracione adequadamente, corrigindo o movimento), não ouso rodar pela auto-estrada siciliana no mesmo ritmo voraz de Dario Benuzzi, piloto-chefe dos testes da Ferrari, que horas antes cravara quase os 310 km/h de velocidade máxima com Montezemolo a seu lado. Benuzzi, com 37 anos de experiência e milhares de quilômetros com as máquinas de Maranello, começou a desenvolver o modelo ao lado de Michael Schumacher. A partir de 220 km/h e 6 000 rpm, o asfalto irregular da rodovia siciliana fazia com que o carro balançasse além da conta. Mas piso o suficiente no acelerador para descobrir boas características do carro. Controlado por borboletas no volante ou em modo automático, a transmissão com sete marchas concebida pela alemã Getrag é acionada por duas embreagens que funcionam simultaneamente. Enquanto uma responde pelos engates da primeira, terceira, quinta e sétima marcha, a outra cuida de segunda, quarta e sexta. A vantagem? Menos tempo gasto nas engates e mais precisão, já que o próxima troca já está engatilhada. No ano que vem, está o previsto o lançamento de uma versão manual, com acionamento convencional.
Arrancada perfeita Minutos depois, em uma estrada secundária, em segurança, experimento o “launch-control”, que cuida de proporcionar uma arrancada perfeita, acionado por um botão no console, ao lado da marcha-à-ré e do botão que passa o câmbio para a opção automática. Com 3,9 segundos para ir de 0 a 100 km/h e 12,2 segundos para partir de 0 a 400 metros, segundo a fábrica, ela não deve nada à F430 no quesito arrancada. Aproveito para abaixar a capota de alumínio, operação feita em 14 segundos. Mesmo em alta velocidade e com o vento, consigo apreciar o ronco do V8, ouvir música (ela tem rádio, CD player e acesso para MP3 e entrada USB) e conversar. “Foram cerca de 1 000 horas em túnel de vento para fazermos um carro com esta acústica e com boa distribuição dos fluxos de ar”, diz Corradi.
Apesar de o motor ser dianteiro, cerca de 53% do peso estão distribuídos na parte traseira, onde está montado o câmbio. O volante, com a base achatada, é mais que insinuante e nos trechos mais sinuosos, usando a opção mais esportiva de acerto, o carro tende a sair um pouco nas curvas, quando o pedal do acelerador é apertado com mais firmeza. Isso exige algum tempo para que se conheça seu equilíbrio, antes de correr sem passar sustos.
Com a finalidade de privilegiar o conforto, a suspensão traseira foi refeita com braços multilink. O controle de tração F1-Trac foi emprestado da F599 Fiorano e funcionou muito bem. Além de airbags, o carro tem barras, acionáveis em milissegundos, que protegem os ocupantes em caso de capotamento na posição conversível.
A má notícia é que a Ferrari California não desembarcará tão cedo no Brasil. Pelo menos até junho do ano que vem, o modelo será vendido exclusivamente na Europa, por cerca de 180000 euros. No primeiro semestre de 2009, o modelo chegará aos Estados Unidos. Por aqui, talvez, daqui a um ano. Ela espera seduzir clientes que hoje rodam em Porsche 911 Turbo, Mercedes-Benz SL 63 AMG, Bentley Continental e Aston Martin DB9 Volante. A meta é vender cerca de 2000 carros a mais a cada 12 meses. Carisma, tecnologia e disposição não faltarão como bons argumentos para que esta Ferrari dos novos tempos faça um grande sucesso também por aqui.
Nos meses que antecederam o lançamento, muito foi dito sobre a California. Anunciou-se que ela seria uma mini-Ferrari, um carro mais barato. “Essa idéia nunca existiu”, disse Luca di Montezemolo, presidente da Fiat, controladora da Ferrari. “Desde o início, nosso plano era fazer um Gran Turismo inédito que permitisse conquistar novos consumidores, mas com performance e conforto dignos de nossa tradição.”
Para chegar à California, atravessamos a Itália e fomos a Mazara del Vallo, na extremidade oeste da Sicília, a ilha onde o modelo foi apresentado sob o sol que nesta época abandona Maranello, no centro da Itália, e deixa uma bruma cinzenta, típica dos meses mais frios, tomando conta dos arredores.
A nova Ferrari foi inspirada em um clássico italiano dos anos 1950. Em 1957, a 250 California foi desenvolvida a pedido dos dois distribuidores da marca nos Estados Unidos, o italiano Luigi Chinetti e o norte-americano John von Neumann. A dupla pretendia turbinar as vendas da marca com um modelo charmoso e possante, ideal para rodar pelas estradas ensolaradas da costa oeste americana. Enzo Ferrari ouviu os argumentos e topou produzir o conversível. Foi um sucesso que marcou época. Do clássico desenhado por Battista Pinin Farina, a recém-chegada herdou traços como as entradas de ar no capô e nos pára-lamas e a linha lateral. É um projeto completamente novo, com chassi e carroceria de alumínio.
“Há quatro anos, quando começamos a conceber o carro, não pensamos em um modelo com estilo retrô, mas em um carro bonito e veloz, mas não necessariamente extremo, como os feitos para quem gosta de eventos de pista”, diz Roberto Corradi, diretor de desenvolvimento do California. O resultado é um carro elegante, com 4,56 metros de comprimento, chassi e carroceria de alumínio, capô alongado, elegantes faróis com diodos e lanternas bem redondas que se projetam sobre os flancos traseiros.
Opções no cardápio Bonita por fora, por dentro a nova Ferrari não desaponta ao reunir o melhor do mundo dos carros luxuosos. No painel de instrumentos destaca-se o grande conta-giros (ladeado pelo velocímetro) analógico, com um indicador de marchas. À esquerda, um dispositivo digital mostra as funções de relógio, termômetro e também pode mostrar temperatura do motor e do radiador e pressão dos pneus. Os bancos dianteiros, esportivos e revestidos de couro e com regulagem elétrica, acomodam bem os ocupantes, que contam com ar-condicionado dual zone. O mesmo elogio não se estende ao espaço disponível atrás, apesar de os engenheiros da marca italiana e o próprio Montezemolo definirem a California como um 2+2. Mas, se falta espaço para as pernas de adultos na parte traseira, há razoáveis 240 litros no porta-malas, mesmo com a capota abaixada (com ela recolhida, essa capacidade ganha mais 100 litros). Há a vantagem de aproveitar o espaço na parte de trás para carregar objetos maiores, já que ela se comunica com o porta-malas.
Giro a chave na ignição e aperto o botão para dar a partida, o “Engine Start”, não por acaso pintado de vermelho, situado à esquerda no volante. Antes de seguir na direção de Trapani, a oeste, sobre asfalto úmido, calibro o manettino – o seletor, do lado direito da direção, que regula a suspensão e a tração do carro – para a posição confortável (no cardápio há ainda a opção esportiva e a que libera o controle de estabilidade). Depois de acelerar o V8 apenas para ouvir sua “música”, o vento frio me convence a fechar a capota e decido iniciar o percurso posicionando o manettino na opção esportiva. Que a diversão comece.
Com os mesmos 4,3 litros do motor que equipa a F430, a California tem 460 cv, 30 a menos. “São duas arquiteturas bem diferentes, em que privilegiamos o conforto no novo modelo”, afirma o italiano Vittorio Dini, engenheiro da Ferrari que coordenou seu desenvolvimento. Segundo ele, o bloco é o mesmo, mas os diâmetros dos cilindros são distintos: 94 milímetros na California, 92 milímetros na F430. “Com isso, privilegiamos o torque em baixa rotação”, diz Dini. Outra mudança é que com a injeção direta a taxa de compressão passou para 12,2:1, ante 11,3:1 na F430, o que ajudou a reduzir consumo e emissões de CO2. “A California consome cerca de 15% a menos que a F430 e é um belo passo na direção de carros mais econômicos e menos poluentes”, afirma Dini.
Com discos de cerâmica e F1-Trac, o controle de tração que equipa a California (e que entra em ação caso uma das rodas não tracione adequadamente, corrigindo o movimento), não ouso rodar pela auto-estrada siciliana no mesmo ritmo voraz de Dario Benuzzi, piloto-chefe dos testes da Ferrari, que horas antes cravara quase os 310 km/h de velocidade máxima com Montezemolo a seu lado. Benuzzi, com 37 anos de experiência e milhares de quilômetros com as máquinas de Maranello, começou a desenvolver o modelo ao lado de Michael Schumacher. A partir de 220 km/h e 6 000 rpm, o asfalto irregular da rodovia siciliana fazia com que o carro balançasse além da conta. Mas piso o suficiente no acelerador para descobrir boas características do carro. Controlado por borboletas no volante ou em modo automático, a transmissão com sete marchas concebida pela alemã Getrag é acionada por duas embreagens que funcionam simultaneamente. Enquanto uma responde pelos engates da primeira, terceira, quinta e sétima marcha, a outra cuida de segunda, quarta e sexta. A vantagem? Menos tempo gasto nas engates e mais precisão, já que o próxima troca já está engatilhada. No ano que vem, está o previsto o lançamento de uma versão manual, com acionamento convencional.
Arrancada perfeita Minutos depois, em uma estrada secundária, em segurança, experimento o “launch-control”, que cuida de proporcionar uma arrancada perfeita, acionado por um botão no console, ao lado da marcha-à-ré e do botão que passa o câmbio para a opção automática. Com 3,9 segundos para ir de 0 a 100 km/h e 12,2 segundos para partir de 0 a 400 metros, segundo a fábrica, ela não deve nada à F430 no quesito arrancada. Aproveito para abaixar a capota de alumínio, operação feita em 14 segundos. Mesmo em alta velocidade e com o vento, consigo apreciar o ronco do V8, ouvir música (ela tem rádio, CD player e acesso para MP3 e entrada USB) e conversar. “Foram cerca de 1 000 horas em túnel de vento para fazermos um carro com esta acústica e com boa distribuição dos fluxos de ar”, diz Corradi.
Apesar de o motor ser dianteiro, cerca de 53% do peso estão distribuídos na parte traseira, onde está montado o câmbio. O volante, com a base achatada, é mais que insinuante e nos trechos mais sinuosos, usando a opção mais esportiva de acerto, o carro tende a sair um pouco nas curvas, quando o pedal do acelerador é apertado com mais firmeza. Isso exige algum tempo para que se conheça seu equilíbrio, antes de correr sem passar sustos.
Com a finalidade de privilegiar o conforto, a suspensão traseira foi refeita com braços multilink. O controle de tração F1-Trac foi emprestado da F599 Fiorano e funcionou muito bem. Além de airbags, o carro tem barras, acionáveis em milissegundos, que protegem os ocupantes em caso de capotamento na posição conversível.
A má notícia é que a Ferrari California não desembarcará tão cedo no Brasil. Pelo menos até junho do ano que vem, o modelo será vendido exclusivamente na Europa, por cerca de 180000 euros. No primeiro semestre de 2009, o modelo chegará aos Estados Unidos. Por aqui, talvez, daqui a um ano. Ela espera seduzir clientes que hoje rodam em Porsche 911 Turbo, Mercedes-Benz SL 63 AMG, Bentley Continental e Aston Martin DB9 Volante. A meta é vender cerca de 2000 carros a mais a cada 12 meses. Carisma, tecnologia e disposição não faltarão como bons argumentos para que esta Ferrari dos novos tempos faça um grande sucesso também por aqui.
Veredicto
Um conversível e um cupê quase pelo preço de meia Ferrari. E sem abrir mão do prazer e do prestígio, itens de série da marca.